domingo, 9 de setembro de 2012

Mozart, sociologia de um gênio.


Mozart, sociologia de um gênio, escrito pelo sociólogo e historiador cultural Norbert Elias é na verdade uma série de textos posteriormente organizados por Michael Schröder e publicados no formato do livro ano de 1991 com o título Mozart, Zur Soziologie eines Genies, em 1994 a editora Zahar publicou a tradução da obra em português constando 150 páginas. O posfácio do organizador (pg. 141) indica que os textos sobre Mozart fariam parte de um projeto maior que teria por título Der bürgerlich Künstler in der böfischen Gesellschaft (O artista burguês na sociedade de corte). No posfácio do organizador estão descriminado todos os textos do arquivo Elias que compuseram a obra Mozart, sociologia de um gênio.
O livro está dividido em duas partes a Parte I intitulada reflexões sociológicas sobre Mozart, subdividida em 7 partes (ele simplesmente desistiu, músicos burgueses na sociedade de corte, Mozart se torna artista autônomo, arte de artesão e arte de artista, o artista no ser humano, os anos de formação de um gênio, a juventude de Mozart – entre dois mundos sociais), a parte II do livro tem quatro subdivisões (a revolta de Mozart: de Salzburgo a Viena, completa-se a emancipação: o casamento de Mozart, o drama da vida de Mozart, uma cronologia sob a forma de notas), além de conter Duas notas do organizador, o posfácio do organizador e o índice.
A problemática desenvolvida por todo o livro gira em torno do desejo de Mozart querer ser um artista “emancipado”, porém numa sociedade que ainda não estava pronta para artistas autônomos. Junto dessa problemática está o desenvolvimento da vida de Wolfgang e da influência que seu pai Leopold exerceu sobre ele.
O livro se inicia com a biografia de Mozart e como seus anseios começam a surgir, Elias sugere que os desejos de Mozart “são responsáveis, em grande medida, pelo curso trágico de sua vida”.[1]
Wolfgang Amadeus Mozart nasceu numa ocasião que “o gosto da nobreza de corte estabelecia o padrão para os artistas de todas as origens sociais”,[2] que o ofício de músico era como qualquer outro ofício de serviçal, não havia espaço ainda para a “emancipação” do artista.
Leopold Mozart era um desses serviçais, era um burguês da corte, que não tinha seu reconhecimento pleno como músico, foi um homem acostumado com a subordinação. No capítulo Mozart se torna artista autônomo, Elias aponta como Mozart não consegue se enquadrar no padrão até então estabelecido, Mozart “antecipou as atitudes e os sentimentos de um tipo posterior de artista”.[3] “Mozart não assumiu a posição de “artista autônomo” apenas porque assim quis; isso aconteceu porque ele, simplesmente, não suportava mais o trabalho na corte de Salzburgo”. [4]
Norbert Elias expõe um Mozart que a história tradicional não está acostumada a ver, o Mozart tradicional é o gênio e apenas gênio, o Mozart apresentado por Elias traz suas angústias junto do seu desenvolvimento como ser humano. Em arte de artesão e arte de artista Elias aponta para a função da obra de arte, no capítulo seguinte o artista no ser humano, o gênio por detrás do homem toma constantemente a frente da perspectiva humana, “O sobrevivente, talvez, é que Mozart sobrevivesse a sua perigosa fase como menino prodígio, sem que seu talento tenha sido destruído”.[5]
Por outro lado “a relação entre o “homem” e o “artista” tem sido um elemento especialmente desconcertante para muitos estudiosos, porque o quadro que emerge das cartas, relatórios e outras evidências combina mal com o ideal preconcebido”,[6] o Mozart que Elias busca era o humano, o caráter genial não fica de fora da análise, mas o homem por traz da obra vem à luz. Nesse ponto Elias expõe a “sublimação” que muitas das obras de Mozart trazem em si, muitas vezes Mozart ouvia a peça musical dentro de si, e ela ganhava forma[7].
Em os anos de formação de um gênio, um amplo panorama de vida de Mozart é exposto, sua formação cada vez mais rígida, a influência e os desejos constantes de Leopold aplicados a formação de Wolfgang. [8]
Portanto, foi nessa escola que Mozart cresceu, ligado a um pai para quem o sucesso social e financeiro do filho na infância e adolescência representou a última e única possibilidade de escapar a uma situação insuportável e alcançar o sentido e realização na vida.

Elias mostra como “Leopold fez da educação do filho o propósito dominante de sua própria vida”. [9] Os pontos desse capítulo, na qual Mozart foi submetido, são os estímulos, o processo de sublimação, a autoconfiança que aos poucos Wolfgang foi ganhando, a consciência de seu valor como artista e após todos esses pontos começa o capítulo a juventude de Mozart – entre dois mundos sociais.
As cartas trocadas entre Leopold e Wolfgang são os alicerces da sociologia de um gênio, através delas percebemos como se dava a relação social de Mozart em seu tempo, com elas Norbert Elias traça a trama sócio-cultural da sociedade da época de Mozart. Nesse capítulo Mozart já na juventude ainda sofre influência do pai, porém alguns traços de sua personalidade começam a ressaltar. Elias se preocupa com alguns traços do humor de Mozart, suas piadas e suas primeiras paixões.
Até esse ponto o livro já aponta um Mozart que cresceu com uma angustia de viver numa sociedade que os artistas não tinham reconhecimento, que a influência do pai traçou seu rumo musical e representou uma esperança em relação às dificuldades financeiras.
A revolta de Mozart: de Salzburgo a Viena. “Em maio de 1781, a tensão entre Mozart, o irascível jovem músico, e seu não menos irritável empregador e senhor, o arcebispo de Salzburgo, conde Colloredo, transformou-se em conflito aberto”.[10]
Amadeus Mozart não escondeu sua insatisfação revoltou-se contra o arcebispo e pediu-lhe a carta de demissão, assim se inicia a segunda parte do livro.
Mozart não era mais um fenômeno, não era mais criança prodígio, tinha atingido idade adulta, a sociedade exigia sempre algo novo, tinha 25 anos quando pediu demissão e rompeu com o pai. Segundo Elias Mozart tinha um senso de realidade limitado, [11] seus atritos com o pai começa a influenciar suas obras.      
Elias aponta os conflitos da música do artista e do artesão, ou seja, a música do artista autônomo em contradição com a música artesanal da corte,[12] mostra também que Mozart “tinha inaugurado outro deslocamento na relação de poder”, quando não se submeteu a vontade dos cantores e compôs o que queria.
O penúltimo capítulo do livro completa-se a emancipação: o casamento de Mozart, Norbert Elias mostra o ponto efetivo do início da vida adulta de Mozart, com o casamento que o pai não aprovava, com uma vida de músico autônomo, sem que conseguisse emprego em outra corte. Os conflitos apresentados nas cartas são ainda maiores. Mozart estava ainda mais inclinado nas óperas
A finalização do livro organizado por Schröter tem por título O drama da vida de Mozart: uma cronologia sob a forma de notas. Aqui é apresentado o problema sociológico da transição da arte de artesão para a arte de artista. Elias aponta a questão para o processo de sublimação, e da combinação do livre fluxo de fantasia, na qual Mozart fez parte e que o fez ser um outsider, que o fez não se adaptar na sociedade, que por sua vez esperava que ele fosse um subalterno, como todos os outros músicos.
A vida de Mozart é apresentada em quatro “atos”, como a separação de uma ópera. Norbert Elias resume a vida de Mozart em quatro atos.
Não se pode conhecer intimamente o artista sem que se conheçam suas aflições e como ele se situava na sociedade, de fato a música de Mozart atinge um grau elevadíssimo de “obra de arte”, contudo Norbert Elias expõe pontos da personalidade do artista e o que o fez ser quem foi.

Bibliografia:
ELIAS, NORBERT.Mozart, sociologia de um gênio. Rio de Janeiro: Zahar, 1995.


Notas:


[1] Pg.13.
[2] Pg.17.
[3] Pg. 34.
[4] Pg. 41.
[5] Pg. 53.
[6] Pg. 55.
[7] Pg. 63.
[8] Pg.76.
[9] Pg.79.
[10] Pg.111.
[11] Pg.122.
[12] Pg.124.

2 comentários:

  1. Cara... achei interessantíssimo esse livro. As aflições de Mozart quanto a fazer arte, ser espontâneo e não querer se encaixar numa fórmula da época , se é que tenho o direito de comparar, não eram distantes das que passamos agora.

    Muito bom... preciso fazer aula com vc!!! :-)

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